Recebi um testemunho de um casal amigo, que partilho com você, leitor. Antonio Carlos e Laura, por razões de emprego, mudaram sua residência. Muito ativos em sua paróquia, ele no Conselho, ela catequista, logo iriam procurar a igreja próxima de sua casa, mas tiveram antes uma surpresa: ainda estavam ajeitando a mudança na casa nova, quando a vizinha do lado percebeu, e veio perguntar se precisavam de alguma coisa. Não, não precisavam. Mas ficaram agradecidos. Talvez a mesma vizinha foi responsável por uma primeira visita de Marlene, uma Ministra da Paróquia: responderam de onde vinham, que eram católicos, que tinham, sim, muito gosto em conhecer a comunidade. Se precisassem de algo podiam contar com os amigos dali do bairro: Havia um grupo, ali mesmo, que se reunia para oração e estudo bíblico. Seriam bem-vindos. Domingo foram à missa, e já foram reconhecidos e cumprimentados. Sentiram-se em casa. Laura me escreve assim: “Dom João, fiquei um pouco incomodada, no começo, com aquela intromissão na nossa vida de recém-chegados, casa bagunçada, mudança... Mas logo vi que todos tinham muita familiaridade e frequentavam as casas uns dos outros. Passamos a fazer parte dessa pequena comunidade. Nossos filhos encontraram amigos da sua idade. Depois conheci o pároco, um homem afável e acolhedor. Vi com que cuidado como ele acolhia e orientava umas pessoas que queriam o batismo, mas não eram casados. Na parede da secretaria paroquial, um pequeno cartaz mostrava os horários de atendimento e telefone de contato, inclusive o celular do padre. Por sobre o cartaz estava escrito: “Paróquia Nossa Senhora Mãe da Igreja – uma família de irmãos”. Logo descobri que aquele grupo que me acolheu era uma das muitas pequenas comunidades que a Paróquia formou por toda a cidade. Isso me explicou a Ministra, a Marlene, que tinha vindo à Matriz pra uma tarde de formação especial para os Ministros responsáveis de comunidades. Fiquei pensando na minha antiga paróquia: quantos anos nós passamos lá, ajudamos nas festas, a liturgia era bonita, e o padre sempre foi nosso amigo. Mas ninguém, nem o padre, nos perguntou por que mudamos, ou se precisávamos de alguma coisa. Mudamos de paróquia, e parece que encontramos uma nova Igreja, com Liturgia bem participada, com um projeto missionário que se serve dos pequenos grupos para visitar os bairros, encontrando os não participantes e necessitados. Já fizemos nossa inscrição no dízimo, e estamos pensando em ajudar num projeto de formação para portadores de deficiência, com vistas a capacitá-los, junto com um grupo de empresários, para o mercado de trabalho. Meus filhos estão empolgados em uma campanha de doações para os jovens formarem uma videoteca circulante. Já conseguiram uma centena de vídeos. E estão construindo um site, que o pároco lhes pediu, para comunicar as coisas da paróquia e conquistar outros jovens...”
O e-mail de Laura continua comparando a nova paróquia com a antiga. Eu conhecia bem aquela paróquia onde estavam antes: era uma igreja grande, onde os paroquianos mal se conheciam. Não havia um plano de pastoral, e a vida da paróquia se resumia na liturgia (quase sempre os mesmos); as “aulas” catequese das crianças, sem uma verdadeira iniciação à vida cristã; e os “cursinhos” de batismo e de noivos, de uma só palestra, pouco atrativa. O pároco, muito esforçado, porém, estava sempre ocupado com administração. Tudo ficava centralizado no padre, e os leigos não tomavam decisões nem assumiam compromissos. Por isso, o padre não tinha tempo de formar uma equipe missionária, nem de visitar as casas, e muito menos formar pequenas comunidades, pois isso daria muito trabalho...
Coragem de mudar estruturas obsoletas
Achei interessante esse testemunho de Laura, exatamente agora que a Igreja nos pede uma renovação das paróquias. O Documento de Aparecida pede a coragem de ultrapassar uma pastoral de mera conservação. Sugere mudar as estruturas obsoletas que já não favorecem mais a transmissão da fé. Reconhece que as paróquias, há muitos séculos, vem sendo o lugar onde a maioria dos cristãos vivem sua experiência de fé e sua vida de oração. Mas insiste que a paróquia precisa ser renovada, tornando-se “uma comunidade de comunidades”. O que quer dizer isso? É simples: uma igreja paroquial onde se assentam quatrocentas, seiscentas ou até mil pessoas na missa dominical, que “assistem” a missa e vão pra casa, e procuram a igreja quando precisam de socorro espiritual, batizados, casamentos e funerais, não é uma comunidade de fato. Em se formando pequenas comunidades, integrando os movimentos, instruindo coordenadores de grupos, oferecendo material bíblico-catequético para os pequenos grupos, incentivando as relações de acolhida e de amizade, começa a surgir uma nova paróquia. Nos pequenos grupos é que existe verdadeiro convívio, vínculos profundos, interesses comuns, solidariedade nas alegrias e nos sofrimentos. Facilita a que os mais afastados se aproximem e tenham mais vínculos com a paróquia. A Igreja paroquial, a matriz e as capelas, não perdem a sua importância. Continuam sendo o ponto de encontro de todas as pequenas comunidades que se alimentam, da palavra e do amor. Essa proposta do Documento de Aparecida foi inspiradora das cinco “urgências” expressas pelas Diretrizes Gerais da CNBB, mas ainda estão longe de chegar às nossas paróquias, pois todo o caminho de renovação é lento, exigente, porém compensador.
A renovação paroquial em todo o Brasil
Já está à disposição das paróquias de todo o Brasil o documento 104 da CNBB, aprovado pelos Bispos, com o título “Comunidade de Comunidades: Uma nova Paróquia”. No Brasil temos em torno de doze mil paróquias, em quase 300 dioceses. O texto de estudos nº 104 se dirige a todas elas, nas mais diferentes realidades: grandes extensões na Amazônia, secos rincões no Nordeste, regiões pouco habitadas do Mato Grosso, sertões de Minas, ou vastos campos no Sul, grandes cidades com muitos prédios ou imensas favelas, todas as paróquias deverão estudar estas propostas e, com criatividade, encontrar formas de colocá-las em prática, seja qual for a realidade cultural e geográfica.
Os bispos pedem que durante este ano de 2013, as dioceses, as paróquias, as comunidades se dediquem a essa renovação paroquial, à luz do documento aprovado. “Quanto mais membros das nossas comunidades puderem conhecer o texto, adaptando-o aos seus contextos próprios, mais chance se terá de obter êxito no processo de construção da nova paróquia”. (cf. Doc 104, §5). Este documento pode ser encontrado nas livrarias católicas, e também baixado do site da CNBB.
Em União da Vitória, na última reunião do Clero, no final de abril, os padres e diáconos tomaram conhecimento desse texto. Também os Coordenadores da Ação Evangelizadora, de todo o Paraná, trataram desse tema em seu último encontro, nos dias 14 e 15 de maio. Agora é a hora dos Conselhos Paroquiais, começarem um estudo mais aprofundado, para conhecer as proposições, adaptar às diferentes realidades, usar a criatividade e responder, com coragem, responder à pergunta básica que perpassa as cento e poucas páginas deste texto: olhando para a nossa paróquia, quais as atividades, práticas pastorais, iniciativas que favorecem um encontro pessoal e profundo com Cristo? Quais as atividades que já não servem mais para isso? O que é que ajuda a formar e manter compromissos sólidos com a comunidade? Ao responder corajosamente a essas perguntas, vamos encontrar, por certo, a proposta feita no Documento 104: uma comunidade paroquial focada na formação de pequenos núcleos de vivência cristã, alimentados pela Palavra, marcados pelo espírito missionário. Em nossa diocese, é crescente o número de grupos que se reúnem, durante todo o ano, com os roteiros dinâmicos preparados pelo Regional Sul 2. Recomendo esses roteiros, pois têm conseguido entusiasmar, encantar os membros dos grupos e com isso estão atraindo novos membros e formando novos grupos.
Encontrando caminhos
O documento 104 foi aprovado pelos Bispos do Brasil, no último encontro de 2013, em Aparecida, mas, com a condição de ser completado no ano que vem. Um tema tão importante – a paróquia – com tanta repercussão na vida cristã da nossa gente, não pode ser fruto apenas da ciência dos Bispos, por mais dedicados que sejam. Por isso, eles insistem no caminho do debate, da aplicação prática, na comunicação de experiências bem sucedidas em todos os recantos do país. À luz dessa troca de informações, um novo documento será proposto, já com propostas pastorais mais definidas, que retornarão às dioceses e comunidades com sugestões concretas e práticas mais consolidadas. Será que teremos, em nossa diocese de União da Vitória, uma contribuição positiva nesse processo de renovação paroquial? Deixo registrada aqui minha esperança e desafio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário